segunda-feira, 11 de abril de 2011

Instinto assassino



“Acho que é o fim da picada tirar a vida de alguém desse jeito...” diz Perry Smith ao ser condenado à forca após assassinar quatro pessoas da mesma família. O enredo é do livro “A Sangue Frio” de Truman Capote. Nele, o autor relata o brutal assassinato da família Clutter, desvenda os pensamentos dos assassinos e o desfecho nas mãos do carrasco.
Cheguei as últimas páginas da obra no dia 7 de abril, data do massacre na Escola Tasso da Silveira, no Rio de Janeiro. Difícil não comparar a brutalidade dos acontecimentos. Um jovem invade uma escola, atira contra crianças e comete suicídio. Resultado: 13 mortos, 20 feridos e uma sociedade sem resposta. O que faz alguém cometer algo assim?
Dois jovens planejam um assalto grandioso, sem deixar rastro de testemunhas. Invadem uma casa, amordaçam uma família de quatro membros, descarregam a espingarda nas cabeças das vítimas e levam pouco mais que 40 dólares... Seria tudo isso obra de mentes perturbadas?
A obra de Truman Capote e o massacre na Escola Tasso da Silveira me remetem ao livro “Mentes Perigosas – o Psicopata mora ao lado” de Ana Beatriz Barbosa Silva, autora também de “Bullying – Mentes perigosas nas escolas”. Ana Beatriz é médica graduada pela UFRJ com pós-graduação em psiquiatria.
Em “Mentes Perigosas”, ela descreve o comportamento “normal” de um psicopata. Frios, manipuladores e cruéis. Capazes de cometer qualquer coisa sem culpa ou remorso. Entretanto, nem todo psicopata, de acordo com a médica, chega a cometer um assassinato. São pessoas desprovidas de consciência, que enxergam no outro apenas uma fonte para satisfazer seus caprichos.
Já em “A Sangue Frio” algo me prende nas palavras do psiquiatra que analisa a mente de Perry. “Ao atacar o Sr. Clutter, Smith estava em ‘eclipse mental’, dentro de uma profunda escuridão esquizofrênica, pois não era um homem de carne e osso que ‘se descobrira subitamente destruindo’, mas uma ‘figura-chave em alguma configuração dramática em seu passado’”. (pág 361). Perry admite que não queria fazer mal aquela família. “Não foi nada que os Clutter tivessem feito. Nunca me fizeram nada. Como os outros fizeram (...) Vai ver os Clutter é que tinham de pagar por tudo”. (pág 361)
Fico imaginando os motivos que levaram o jovem Wellington Menezes de Oliveira a sacrificar crianças. Acho que é esta é a pergunta feita por todos. Terá ele, assim como Perry, vivido uma vida de conflitos que causou a alteração na construção do ego? “Assassinato sem motivo aparente” como classificou o psiquiatra em “A Sangue frio”. Ou ainda como descreve Ana Beatriz: “Psicopatas são pessoas ruins, nasceram assim e vão morrer assim”. De repente me pego pensando: Teria Deus criado obra tão imperfeita? Capaz de arrancar vidas? Ou seria talvez, as tais ervas daninhas que precisam crescer junto à boa semente, para só no final serem separadas e queimadas?
Não podemos justificar as atitudes do autor de um crime tão bárbaro. Ele teve uma vida difícil, uma mente transtornada. E daí? O que meu filho, meu conhecido ou meu parente tem haver com isso? Por que inocentes precisam ser sacrificados? Por outro lado, é fácil julgar as atitudes do outro. Quando não conhecemos a guerra travada em seu interior.
O fato é que a explicação para acontecimentos como esses estão muito além do que o conhecimento da mente nos permite observar. Muitas hipóteses são levantadas. Mas a resposta não vem. Ainda não somos capazes de compreender as atitudes, capacidades e limitações do ser humano. Não temos total conhecimento da personalidade do outro nem dispomos de mecanismos para alcançar a consciência do outro. Às vezes, nem mesmo dominamos a nossa própria consciência.
O que sobra em mim da trágica quinta-feira de Realengo ou ainda dá impressão que a obra de Capote me traz é a sensação de complexidade. Tantas hipóteses, tantas respostas. Nenhuma capaz de responder: O que faz alguém cometer algo assim?